domingo, 28 de junho de 2009
DO RECONHECIMENTO
"O grupo sentiu a necessidade de um líder reconhecido; ao mesmo tempo, senti a necessidade de ter meu recém-descoberto poder reconhecido. O coven confirmou-me como sacerdotisa."
Dança Cósmica das Feiticeiras - Starhawk
Acho que todos já assistiram o filme "O Náufrago", com Tom Hanks. Como o título deixa claro, o personagem em questão se acha preso em uma ilha, longe do contato humano. Para não enlouquecer, fabrica um "amigo". Eu chamo isso de Efeito Bola Wilson. A vida isolada o teria transtornado se não usasse deste recurso pois nós somos animais sociais por natureza, e precisamos do reconhecimento do outro para legitimar de tempos em tempos nossa humanidade.
Nos grupos sociais em que vivemos, como família, escola, trabalho, rua, bairro, cidade ou país, também buscamos nosso lugar e reconhecimento das qualidades que temos. Nos esforçamos para que o melhor de nós seja apontado pelos outros, isto é um fato. E quando isso não acontece apesar de todos os esforços desprendidos, nasce o vazio no peito.
"Você sabe com quem está falando?"
Em algum momento de sua vida você ouviu ou ouvirá está frase. Ela nasce de um indivíduo que possui um título. Qualquer título. E, quando alguém acredita nele comete essas gafes.
Mas a verdade é que títulos, crachás, emblemas são apenas símbolos. E qualquer bruxo que se preze sabe que símbolo não é a verdade, mas sua representação. A verdade tem um pé no real, na prática, na convivência diária.
E nada melhor para provar se o título corresponde à verdade é submeter seu portador à realidade. Não adianta esfregar na cara: tem que provar que sabe. Do contrário, é coerção, abuso, violência.
Katy de Mattos Frisvold nos escreve:
"Ofício é uma profissão, pois se observarmos a pista etimológica, encontraremos a palavra originada do latim officiu, que significa o dever, trabalho de uma pessoa. O povo é que elege a bruxa, procurando-a como a sabia, a ‘consoladora’, a que traz paz de espírito. Seja pela palavra, pelo oráculo, pelo chá servido e o recomendado, ela dá força para que a labuta diária continue apesar dos dramas humanos".
Fonte: Diablerie
O outro é nosso espelho
Nos preparemos para reconhecer no outro as qualidades que faltam em nós para que, quando o momento surgir, ele possa assumir com brilhantismo a liderança e nos guiar pela escuridão da ignorância. Reconhecer no outro a Centelha Divina que tornará aquele trecho da caminhada um pouco menos acidentado.
E nós, quando for a nossa vez de guiar e, uma vez terminada a necessidade, reconhecer o momento certo de nos recolher com humildade e certeza do dever cumprido. Isto é algo que devemos levar em todos os campos de nossas vidas.
Saúde, amizade, liberdade.
S. Thot
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sexta-feira, 26 de junho de 2009
DA LUZ
Da parte grossa do ovo quebrado, Ergeu-se o excelso arco do céu, E então da gema, a parte de cima, O brilho ardente do Sol tornou-se.(...) Kalevala: A Terra dos Heróis - Tradução de W.F. Kirby.
Desde a primeira ferramenta criada pelo homem, a soma de conhecimento chamada de tecnologia facilitou-nos a vida. Quando queremos que um ambiente se ilumine, basta tocar em um interruptor. Se falta energia, temos hoje o recurso de acender um fósforo ou isqueiro e queimar parafina industrializada.
Imagina a vida de quem vivia somente com a luz das estrelas e da Lua enquanto o sol rumava para outras terras? Tal como a água, para nós é fácil ter o que precisamos. Basta um clique e está tudo a mão. No entanto, quando em outros tempos e outras terras, quando éramos camponeses, os perigos reais e irreais se escondiam no farfalhar das folhas na floresta, na boca dos lobos-guarás e das corujas.
Faltou luz em casa devido as chuvas de Inverno. Mas velas são abundantes aqui e não ficamos totalmente às escuras. E confesso que foi até interessante jantar sob seu brilho tênue. O andar pela casa à noite foi uma experiência interessante. É um espaço conhecido mas as novas sombras mudaram as perspectivas de espaços e objetos. O fato me trouxe lembranças de uma caminhada às escuras na Mata Atlântica, tempos atrás.
Acampando com amigos durante um feriado prolongado, e retornando a minha barraca após um passeio solitário no fim da tarde, senti o medo ancestral. Acostumado com as facilidades urbanas, com os postes com luzes e faróis dos carros velozes, a escuridão me engoliu em cheio. A trilha era conhecida durante o dia, mas a noite a Lua prega peças.
Onde eu pensava ver buracos eram montes. E aonde eu buscava firmeza da terra eu tropeçava. O vento brincava ao meu redor e tinha a nítida impressão que me seguiam dentro da mata, de ambos os lados do caminho. Eu parava para escutar e firmar a visão, mas só via o prateado das folhas próximas.
É lógico que o coração baterá forte e a garganta apertará nestas horas. Com as lanternas e fogueiras a cinco minutos de caminhada ainda, tudo era estranho e hostil. Tão pouco tempo em uma calçada iluminada é besteira, mas ali foi uma eternidade. Não é à toa que a Iniciação em vários círculos mágicos envolvem a restrição de sentidos como a visão.
Acampando com amigos durante um feriado prolongado, e retornando a minha barraca após um passeio solitário no fim da tarde, senti o medo ancestral. Acostumado com as facilidades urbanas, com os postes com luzes e faróis dos carros velozes, a escuridão me engoliu em cheio. A trilha era conhecida durante o dia, mas a noite a Lua prega peças.
Onde eu pensava ver buracos eram montes. E aonde eu buscava firmeza da terra eu tropeçava. O vento brincava ao meu redor e tinha a nítida impressão que me seguiam dentro da mata, de ambos os lados do caminho. Eu parava para escutar e firmar a visão, mas só via o prateado das folhas próximas.
É lógico que o coração baterá forte e a garganta apertará nestas horas. Com as lanternas e fogueiras a cinco minutos de caminhada ainda, tudo era estranho e hostil. Tão pouco tempo em uma calçada iluminada é besteira, mas ali foi uma eternidade. Não é à toa que a Iniciação em vários círculos mágicos envolvem a restrição de sentidos como a visão.
Nossa Psiquê fica totalmente vulnerável e aberta a qualquer experiência que ocorra a nossa volta. Se há algo de racional em nós, diante do desconhecido, esse algo é o primeiro a correr!!! É o mergulho da Deusa nos domínios de Perséfone.
De volta a segurança do fogo e tomando minha sopa, debaixo do cobertor, achei tudo engraçado, logicamente. Ri por dentro e e esqueci o assunto em meio a outras conversas. O tempo passa. E a experiência somente renasceu com a falta da luz em casa e a busca das velas e fósforos, diante do medo ancestral da Escuridão.
Distraídos pelas luzes da cidade e pela fogueira moderna em forma de televisão, não temos tempo suficiente para confrontar-nos conosco e nossos medos. De certo modo vivemos como as mariposas que se batem nas lâmpadas.
De volta a segurança do fogo e tomando minha sopa, debaixo do cobertor, achei tudo engraçado, logicamente. Ri por dentro e e esqueci o assunto em meio a outras conversas. O tempo passa. E a experiência somente renasceu com a falta da luz em casa e a busca das velas e fósforos, diante do medo ancestral da Escuridão.
Distraídos pelas luzes da cidade e pela fogueira moderna em forma de televisão, não temos tempo suficiente para confrontar-nos conosco e nossos medos. De certo modo vivemos como as mariposas que se batem nas lâmpadas.
Até que a Realidade vem e apaga a luz.
Para você, caro leitor, um som da MPB que simboliza o casamento da luz do Sol com as profundezas da Terra...
Sergio Thot
Para você, caro leitor, um som da MPB que simboliza o casamento da luz do Sol com as profundezas da Terra...
Sergio Thot
domingo, 21 de junho de 2009
DO YULE
Arquivo Pessoal |
"É um mundo emaranhado de cipós, sílabas, madressilvas, cores e palavras - limiar da entrada de ancestral caverna que é o útero do mundo e dele vou nascer."
Do livro "Água Viva", de Clarice Lispector
Então chegou o tempo do descanso. Os vermes fizeram seu trabalho e tudo está desagregado. Amorfo, o solo recebe de volta os nutrientes tirados e aproveita a pausa entre as colheitas.
Nunca a fé fora tão necessária que agora. É tempo de resignação, de poupar energia, de racionamento. Exceto por um dia.
Neste dia renovamos os votos com as Divindades, conosco e com a comunidade. E trocamos e dividimos comida e presentes. Porque mesmo apesar da seca, do frio ou da fome, nossa esperança permanece, vela solitária na escuridão a iluminar o caminho.
É tempo do retorno ao Escuro.
O Divino mergulha na escuridão. Sua identidade ficou para trás e agora só resta o esquecimento, a pausa, o ponto mais baixo do pêndulo. Ele mergulha no turbilhão renovador, no Caldeirão onde o Fim e Início se misturam.
Sua mente está limpa e preparada. Existe agora um universo de possibilidades. O terreno onde elas podem nascer está fértil, pois está livre dos medos, dúvidas e ideias preconcebidas. Em breve novos planos nascerão deste terreno fértil onde a capacidade e a necessidade se encontram.
Esteja preparado(a)!!!
Saúde, amizade, liberdade.
Sergio Thot
Ps.: E aqui estamos nós, celebrando o Yule.
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quinta-feira, 18 de junho de 2009
DA VIOLÊNCIA
A questão da violência está implícita na sociedade moderna, que a admite, aceita e alimenta. Mas, como defini-la? O Minidicionário Aurélio define a violência como um ato oposto à justiça. E Justiça é dar cada um aquilo que é seu por direito. Vendo por este ângulo, ações justas tentam reparar, abrandar, restituir atitudes violentas. Temos então um diálogo entre estas duas forças, estas duas ações que moldam a humanidade.
No Wikipedia observei um aprofundamento interessante e que merece ser estudado. Falo sobre isso após assistir um documentário sobre o Paquistão no Discovery. Confesso que andar pelas suas ruas, ainda que virtualmente, me deu novos olhos sobre o povo e me lembrou que nação, pequenos grupos e governo são elementos diferentes dentro da mesma equação.
O que nos foi mostrado foi a vida de gente comum, longe dos estereótipos que acostumamos a ver em filmes e reportagens feitas de alto de hotéis. Mas o ponto em questão, a violência que vi e da qual quero falar não vem da guerra em grandes proporções e seus mísseis inteligentes. Em dado momento a reportagem nos leva a conhecer um salão de beleza. Chicoso, se eu ligasse a tevê naquele momento eu diria que aquele ambiente podia ser Paris ou Milão. Mas os olhos grandes e penetrantes das mulheres não negam: estamos no oriente.
O diferencial do salão está no atendimento que faz a um tipo especial de mulher. Quando as vi fazendo escovas e tinturas, voltei meus olhos com horror e dor. Eu vi algo que já sabia, mas que a pasteurização da notícia não nos deixa enxergar. Duas, três, quatro dentre centenas de mulheres em todo o país, com o rosto derretido por ácido. Um soluço nasceu e brotou no meu peito, talvez uma lembrança do tempo em que fui, seqüestrado, queimado e chicoteado e morto no decorrer das eras. Essa lembrança corre no sangue e ali, diante daquela mulher presa em seu próprio país e agora em seu próprio corpo desfigurado, eu chorei.
Chorei por ela e por mim, por hoje e por ontem. E pelo caminho que ainda temos que enfrentar até que ações assim sejam eliminadas. O crime destas mulheres foi ter uma opinião discordante. E um ato de violência lhes foi imputado. Mas não há ato de justiça capaz de reverter o processo, ou seja, devolver-lhes o rosto e a vida roubadas. É um crime sem justiça. Talvez com punição ou ato de vingança, mas não haverá justiça. Sempre comento sobre o corpo, e que como é impossível amar algo tão gigantesco como a Terra se somos incapazes de amar aquilo que temos ao alcance das mãos, a começar por nós mesmos.
Somos capazes de atos de justiça em nosso cotidiano, reparando males feitos ou ao menos diminuindo sua intensidade. Males feitos a nós e aos outros. Convém analisar as ações e remedia-las em curto prazo. Em longo prazo, evita-las.
Saúde, amizade, liberdade.
Conheça mais sobre o sistema de apoio as mulheres vítimas deste tipo de abuso no site da Fundação Depilex.
E principalmente não interiorize a violência! Não permita que as cicatrizes cheguem a sua alma! Que as lágrimas de Deméter e Perséfone a lavem para que se renove a cada ciclo!
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