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domingo, 26 de abril de 2009

DO SAMHAIN


"Na minha viagem aos mistérios ouço a planta carnívora que lamenta tempos imemoriais: e tenho pesadelos obscenos sob ventos doentios. Estou encantada, seduzida, arrebatada por vozes furtivas.

As inscrições cuneiformes quase ininteligíveis falam de como conceber e dão fórmulas sobre de como se alimentar da força das trevas. Falam de fêmeas nuas e rastejantes.

E o eclipse do sol causa terror secreto que no entanto anuncia um esplendor no coração. Ponho sobre os cabelos o diadema de bronze."


Do livro "Água Viva", de Clarice Lispector

Então chegou o tempo do caos. Sob a terra os talos e frutos não colhidos são devorados pelos vermes. A desordem impera nos campos. As formas se perdem, misturando à terra, ao útero.

Todos se perguntam: o que foi colhido será suficiente para os tempos que se seguem? Durará muito o período de seca? Quando éramos camponeses, este era um período de incertezas, onde só sabíamos que estávamos a mercê da Natureza a nossa volta.

Mas também era (e é) um tempo de fé, de entrega, de afirmação, de uma alegria dos corajosos que cantam em volta das fogueiras, batendo forte o pé no solo enquanto dançam para que saibam que ainda estão vivos e que lutarão para assim permanecer.


É tempo do retorno ao Escuro.


O Divino irromperá pelos portões da Noite Eterna e, a cada passo, se perderá de si mesmo, de sua identidade de seu ser, para mergulhar no turbilhão onde Fim e Início finalmente se misturam.

Então limpe sua mente das coisas passadas, olhe para dentro de sua casa e descarte o que não serve mais, finalize de uma vez suas pendências, comece a arrumar suas coisas pois estamos todos de partida.

Estamos sempre de partida para algum lugar, não?

Saúde, amizade, liberdade.

Ps.: E aqui estamos nós, celebrando o Samhain.



Saúde, amizade, liberdade.



S. Thot



quinta-feira, 23 de abril de 2009

DO CAIPIRA




É interessante ver, vez após vez, que a tradução para pagão, do latim paganus seja camponês. Ou o bom e velho caipira. Já devo ter escrito aqui e ali sobre a dicotomia que existia (existe?) entre o morador civilizado da cidade e o morador do campo. Mas sempre gosto de repetir isso porque é uma verdade fundamental.

Convesando pelo MSN com um amiga virtual, "interessada em coisas esotéricas", perguntei se ela tinha visto a Lua Cheia, esses dias. E ela disse que não, que tais eventos sempre passavam batido. Temos um povo tão mergulhado em livros e teorias que não percebem a realidade básica: o segredo salta aos nossos olhos.

Se não pudermos olhar para a Lua Cheia e nos maravilharmos, ou ver nas nuvens se choverá ou não, ou sentir no vento as mudanças de temperatura que se aproximam, não seremos paganus de verdade.
Vários sítios arqueológicos encontrados possuem entre suas construções observatórios astronômicos, onde os solstícios e equinócios eram demarcados. Isto porque o sagrado e o comum estavam entrelaçados. Era uma questão de sobrevivência. O caipira sabia dessas coisas. Ele tinha que saber pois sua vida econômica dependia destas informações.

O lance é deixar de olhar a terra como um lugar para extrair para ser o lugar onde vamos nos encaixar. Apesar de termos construído um mundo sobre a terra, essas duas partes não tem conversado muito bem. Mas estamos dando grandes passos nessa direção, vide a agricultura orgânica e dos telhados verdes. São soluções tímidas, mas toda caminhada começa com um passo pequeno.

E a questão da terra nunca foi tão discutida no país, desde as Ligas Campesinas, passando por alimentos transgênicos, até o atual MST. São coisas do campo que afetam as vidas das cidades. Afinal, contrariando a ideia das crianças um pouco mais ingênuas, a comida não vem do supermecado...

Agora é diminuir o ritmo das coisas, porque não dá para prover todo mundo de tudo que existe por aí. Esse negócio de modernidade, desta corrida louca pela última novidade... isso tá acabando com a gente! Precisamos repensar os modelos que temos e preparar o futuro que nos aguarda amanhã, quando acordarmos.


E vamos de uma modinha de viola?

quarta-feira, 15 de abril de 2009

DO DIA DA TERRA




Querem saber de uma coisa interessante e que só agora me dei conta? O Dia da Terra não deveria ter esse nome. Vejam: a vida no planeta já resistiu a todo tipo de cataclisma. Mudanças de continentes e correntes marítimas; avanço e recuo de geleiras; choques com meteoritos... E a vida segue. Ela muda, mas segue.

Talvez a questão seja toda essa, que nós tememos a mudança pois certamente, frágeis como somos, seríamos varridos da face da Terra. Haja visto aquele tsunami que alcançou tantos países do planeta, que matou tantas pessoas e mudou a face de cidades inteiras, vindo de um evento cataclísmico que nem foi dos maiores!!!

Não, não é Dia da Terra, mas sim o dia da Existência do Homem sobre a Terra. O que protegemos é nossa sobrevivência através de um modelo econômico e políticos diferentes. Um onde o planeta não seja o mesmo tempo uma gigantesca gôndola de supermercado para se extrair tudo o que se quer, nem como uma grande lixeira, que recebe nossos dejetos como se eles fosse sumir por mágica.

Pense nisso.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

DO CONHECIMENTO





"Com um grito de medo, Ícaro percebeu que a estrutura de suas asas se desfazia. Procurou esconder-se sob as nuvens, mas o sol tornara-se tão imenso que desmanchava as próprias nuvens."

A. S. Franchini e Carmen Seganfredo,
As 100 Melhores Histórias da Mitologia



Conhecimento, em linhas gerais, é informação com propósito. Acúmulo de dados não basta para para designar aquele que os acumulou uma pessoa de conhecimento. Para tanto, ela tem que dar a essas informações um sentido, um uso.

Vivemos hoje mergulhados na informação: conversas, livros, jornais, revistas, rádio, outdoors, cartazes, autofalantes, Ipods, telefones fixos e celulares, tevê, fax, e-mail, Orkut, blogs, sites, MSN, Twitter... Mas tudo isso bate em uma barreira, que é nosso entendimento do mundo. Dou um exemplo simples.

Não é raro, quando ando de ônibus, ver gente jogando lixo pela janela. Desde criança ouço a famosa frase "lugar de lixo é no lixo". No entanto, centenas de pessoas simplesmente fazem do lugar onde estão um aterro sanitário particular. Ainda na questão do lixo, apesar das caçambas de material reciclável disponíveis, no condomínio onde moro os moradores simplesmente não se ocupam de separar e depositar nos recipientes. Simplesmente misturam com o lixo comum, que fica do lado.

Afinal, o que há?


Emoção

Talvez, e falo como leigo no assunto, a informação não seja tudo. Talvez seja preciso um tempero para ela, um sal para que algo se desperte dentro do indivíduo, de modo que a informação se una a ele e torne-se conhecimento. Esse sal pode ser a emoção.

A informação é só um conjunto de palavras & imagens desconexas, mas é nossa participação, quando atuamos como sujeito na história, que elas ganham sentido para nós. Como no caso dos que jogam lixo no chão, ou não separa material reciclável do lixo comum, temos pessoas que não estão ligadas afetivamente com a questão ambiental. Não se sentem parte deste mundo, apesar de nele viver.

Seu mundo é um tanto pequeno, sua percepção das coisas é estreita. Ela olha o mundo e não vê, não sabe onde está nem para onde vai. Apenas segue, sonâmbula. Não basta dizer "ah, as pessoas tem que ter conhecimento", ou "é preciso dar cultura ao povo". Não é esta a questão. O fato é que as pessoas tem que USAR as ferramentas que tem.

Pode-se ler para elas, mostrar-lhes vídeos, fazer palestras e o escambau, mas se elas não sentem, será em vão.

Mesmo entre nós acontece algo semelhante. Temos pessoas que só recolhem fragmentos de informação ao seu bel-prazer, sem qualquer conexão ou senso de realidade. Como esta troca de informações captada do Yahoo! Respostas. Se fossem praticantes, a resposta seria outra.


Na vida

Acredito ainda que este conceito se estende a outras situações. Mesmo quando alertados sobre o perigo iminente, nós pagamos pra ver. Isto é o risco. Aposto e ganho que as pessoas que não separam seu lixo estão ocupadas demais para prestar atenção a estes "detalhes pequenos".

É claro que o mundo existe por meio de quem faz, de quem se arrisca. E não dá para prestar atenção em tudo, ou ficar no canto, encolhido de medo. É preciso parar a beira do penhasco e voar. Mas o risco deve ser calculado, para saber até aonde nossas asas de cera resistem.

Acordar do sonho para que a realidade não nos atropele.



sábado, 11 de abril de 2009

DA ARTE




Nos desenhos animados e nos filmes antigos nos acostumamos a retrata os homens das cavernas como seres primitivos. E particularmente nunca pensei muito no assunto.

Mas lendo obras como o Corpo da Deusa percebi que há um engano nessa ideia. Que não há primitivismo no ser humano que viveu no neolítico europeu pois suas criações artísticas revelam uma forma de pensar o mundo que não se difere muito da nossa, apesar de sua baixa tecnologia.

Olho para a Venus de Willendorf e penso na pessoa que a esculpiu. Não era um primitivo, um ignorante, mas alguém dotado de profunda sensibilidade que, com ferramentas precárias se comparadas com as de hoje, gastou seu tempo e energia para fazer arte. Talvez arte para um símbolo religioso ou amuleto. Mas arte.

Ou as figuras de Lascaux, cuja a produção só seria possível através da construção de andaimes dado o tamanho das obras. Eu não tinha noção de como eram grandes! Veja: um grupo de pessoas se dispõe a trabalhar no escuro, usando somente tochas, misturando tintas, construindo estruturas e gastando seu tempo pintando em cavernas para expressar algo que sentiam, uma visão de mundo. Não, não são primitivas.

Em muitas destas sociedades a questão matrilinear é colocada como verdadeira, devido a importância que a mulher era retratada. Existe a crença de que existia um culto à Deusa Mãe que cria força entre os estudiosos, mas sem provas concretas. A única coisa que é possível dizer a favor deste conceito é que não existem imagens de violência, de guerras ou armas retratadas em um bom período do neolítico europeu até a chegada de tribos belicosas vindas do leste.

Com este novo olhar, penso naquilo que faço hoje, nas contribuições que dou ao tempo e espaço em que vivo e que tipos de coisas ficaram de mim e do mundo em que contribuo com minha força, pensamento e emoção.

Pelo quê seremos lembrados?

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Semente Sagrada

Pretendo neste pequeno mundo meu, aqui exposto na web, colocar finalmente meu eu com simples palavras, como quem planta na terra. Afinal, existe algo mais simples do que uma semente? Uma semente é algo primordial, é o início, a pureza.

Somos sementes, cada um de nós. Esta semana que começa é uma semente. O sagrado faz parte de nós por sermos sementes, a semente morre pra nascer, e todo nascimento é sagrado e toda morte é sagrada. Frágeis, indefesas, entregues, as sementes não escolhem onde germinarão. Simplesmente estão ali, e vivem...

As sementes produzem sementes em seus frutos, elas estão bem aqui conosco, inúmeras, cheias de vida, como crianças brincando.E das sementes saem sementes ...que dão sementes. E o ciclo da vida flui. E Íris derrama suas águas de ventre em ventre.

E é isso, somos sementes, somos o início, somos o novo. E a cada dia nascemos do ventre da Deusa. Afinal descobrimos onde está a vida?a tal vida em abundância? Ela está em mim e em você.

Pois somos Sementes.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

DAS BRINCADEIRAS





Aspectos dos rituais de bruxaria pode, por vezes, parecer absurdos a pessoas muito sérias, que falham em perceber que o objetivo do ritual é o self mais jovem. O senso de humor, de divertimento, são frequentemente a chave para desencadear estados os estados mais profundos da consciência.


A Dança Cósmica das Feiticeiras - Starhawk


O sistema econômico atual nos acostumou a nos fazer pensar no mundo como um lugar onde as coisas podem ter um valor, de preferência monetário. Então esquecemos que boa parte das coisas que nos são mais caras, mais importantes, não são compráveis: um abraço, um beijo, uma palavra amiga.

Quando alguém olha para árvores juntas em um bosque, ou em campos a perder de vista, pode pensar em toras para vender, pastagens para gado ou dizer simplesmente que tudo aquilo é mato. E mato quer dizer inútil para o comércio.

O mesmo se dá no campo das ações humanas. Estamos criando uma máquina tão complexa que hoje temos que atender não à nossa experiência pessoal, mas a procedimentos. Devemos seguir o manual à risca. E isto não é ruim. Na verdade, estamos tao mergulhado na máquina que morreríamos se não fizéssemos assim.

E este processo migra do mundo adulto para o infantil. Não raro passo por escola de ensino infantil que possuem pedagogia empresarial. O espaço para o questionamento, a experimentação, o conhecimento... está tudo desaparecendo, engolido pelo download.

No entanto as coisas (e porque não dizer, as pessoas) possuem um valor intrínseco. Algo que ultrapassa os cifrões e que deve ser levado em consideração. Se nos habituarmos a vermos as coisas assim, de modo partido, desarticulado do todo, não perceberemos quando movermos certas peças. Peças estas que darão início a uma reação em cadeia que tornará nossa existência um pouco mais difícil.

Faça uma verificação de sua vida hoje e veja o que realmente importa para ser carregado e aquilo que é peso morto. Olhe as coisas pelo olhar de uma criança, no sentido de somente querer aquilo que realmente usará.

Vá pelo caminho da simplicidade.


Saúde, amizade, liberdade.


Sergio Thot


Ps.: veja também o texto 1000 ideias para pais pagãos, no blog Crianças Pagãs.