Páginas

quarta-feira, 22 de agosto de 2007

TUDO FLUI


O Rio Nilo, nascido das chuvas periódicas em pleno coração africano e que ruma ao norte, para o Mediterrâneo, testemunhou o surgimento do primeiro Grande Império da História humana. Identificado pelos egípcios como Osíris, o rio Nilo desafiava o deserto em suas cheias anuais. O deserto era visto pelos lavradores como a personificação de Set, seu irmão e rival. As margens que naturalmente se inundam eram dedicadas a Ísis, a Grande Mãe. Poderoso, Osíris também fecunda Neftis, a faixa de terra que suas águas não alcançariam naturalmente, mas que se beneficiam com os canais de irrigação construídos por esta engenhosa nação. Não é exagero afirmar que sem o Nilo não haveria o Egito nem do passado e nem do presente.

Nos tempos atuais, o Nilo sofre com a poluição e obras realizadas em seu leito. Nos anos 60 iniciaram-se as obras da represa de Assuã, cujo lago entre outros problemas pôs em risco importantes relíquias arqueológicas, além de sua eficiência estar aquém das expectativas. Chamam isso de progresso. Será?



E na Terra Brasilis?


Olhando com atenção, há em nossa região paulista um rio cuja as dimensões modestas em comparação ao majestoso rio africano, mas que não eclipsam sua importância. O nosso Rio Tietê, correndo contra o Atlântico desde a Serra do Mar, alavancou as entradas e bandeiras sertão a dentro. Mas centenas de anos antes, servia aos povos autoctones desta terra como via transporte e ligação. Observando o mapa do estado, não é exagero que o rio corta quase que simetricamente, ou antes, o Rio Tietê é a régua, o compasso e esquadro que desenhou o mapa do Estado de São Paulo.

Sinuoso próximo à capital até os primeiros viviam livres da cidade que ajudaria a parir. Hoje São Paulo o espreme em apolíneas retas de concreto, escuro e mal-cheiroso. Chamamos isso de progresso. Será?




Reduzindo ainda mais as proporções mas não a importância do assunto, encontramos em nossa cidade o Rio Baquirivu-Guaçu. Nascido em uma cidade vizinha (Arujá), e que cruza a cidade rumo ao Tietê. Como outros rios de nossa cidade, até os anos 50 o Baquirivu possuía a águas limpas e não raro, férteis em vida.

Com a forte urbanização da cidade e a construção do Aeroporto Internacional de Guarulhos a partir dos anos 80, a ocupação intensificou-se de maneira assustadora. Ao atravessar suas margens usando a ponte da Camargo diariamente, constato que além dos poluentes diluídos (esgotos não tratados de indústrias, comércio e residências), o descaso de seus filhos faz com que sacos de lixo, garrafas PET, animais mortos e até móveis inteiros bóiem em suas águas, nos períodos de seca ou chuvas.

Assoreado pelas construções irregulares nos bairros vizinhos e ameaçado pela ampliação do aeroporto, o Baquirivú pede socorro. Chamamos isso de progresso. Será?

Em 22 de abril tivemos o Dia da Terra (curiosamente também é o dia que os antigos povos dedicavam a Isthar). Menos a comemorar e mais para determinar quais são nossas responsabilidades com o local em que vivemos, amamos, lutamos, rimos, choramos. Um dia para refletir para algo além de nosso umbigo.

Precisamos nos lembrar do era bom, sem perder aquilo que já temos.






Como canta Louis Armstrong:

Rio da Lua,
Mais largo que uma milha
Eu o atravessarei
Com elegância,algum dia
Oh, seu ilusionista,
Seu partidor de corações
Onde quer que você vá
Eu irei

Sim, isto é um convite. Você vem?


Sergio Thot


Um comentário:

  1. Quando progresso e natureza estiverem de acordo, provavelmente é porque não haverá humanos interferindo nisso...
    Haja visto o progresso do planeta muito antes da nossa existência.

    ResponderExcluir

Cultivaram esta Semente: