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quarta-feira, 25 de julho de 2007

DO NOME MÁGICO




A significação do nome tem várias faces. O nome serve para retirar do comum um determinado objeto, atribuir qualidades positivas ou negativas a outros e a nós, e também para exercer domínio sobre o dominado.


No princípio, era o Caos. Então nossa consciência emerge do irracional, e seu primeiro ato de afirmação é submeter o não-eu aos seus critérios. Isto se inicia no nome. Na tradição judaico-cristã, Adão (nomeado assim por YHWH), tem como função primária denominar os seres do mar, do ar e da terra. Desde modo ele se destacaria da natureza, em um divórcio simbólico que perdura até hoje. Para o bem e para o mal.

O nome também possui função adjetiva em muitos casos. Quando nomeamos alguém de Careca, Negro ou Viado, ou Amor, Mano ou Pai. Estes nomes carregam em si uma carga simbólica que ultrapassa o seu significado básico, passando a destacar qualidades ou defeitos que observamos nestas pessoas. E isto é um dado cultural, pois quem é pai para mim pode não ser para outro.

O nome ganha status de poder quando, através do convencimento ou coação, submeto não só o objeto a minha nomeação, mas digo aos outros que, daqui em diante, aquele ser deve chamar-se tal coisa. Muitos escravos negros eram simplesmente coibidos de usarem seus nomes originais, adotando forçosamente o nome de seus senhores. Aqui, temos também um ato político.

O Caos referido anteriormente pode, em um primeiro momento, aludir a bagunça. Mas se olharmos mais profundamente, só é caótico aquilo que não entendemos ou não aceitamos. Para muitos, nossa forma religiosa é caótica por exemplo, apesar dela possuir uma rotina que todos conhecemos. Tudo o que vemos, pelo menos intelectualmente, só existe porque lhe atribuímos um nome.

Então a (re)nomeação busca a retirada intelectual de um objeto da antiga ordem em que ele se encontra. Ele "morre" para seu uso anterior, "ganhando" novas possibilidades de interação. Eis aqui o resultado natural do nascimento, onde deixamos uma existência e passamos a outra. Deixamos também uma determinada forma de agir por outra. E marcamos isso com o novo nome. No nosso caso, o nome mágico.

Perséfone

No mito grego de Kore/Perséfone, a virginal Deusa é raptada por Hades e leva ao submundo. Identificada como o broto, desaparece no seio da terra Gaia. Sua mãe, Demeter a procura pelo mundo e não a encontra. Sabe por Hécate que sua filha foi raptada. Após rogar a Zeus por justiça e não ser atendida resolve deixar o mundo natural, para a desgraça deste. Em jogo estava a frágil ecologia que sustenta homens e Deuses. Rapidamente Zeus pede que a jovem seja devolvida a sua Divina Mãe. Mas esta não é mais o Broto sem nome, mas Perséfone, Rainha dos Mortos.

Atualmente quando ouvimos ou lemos o mito somos levados a pensar que Ela fora enganada e obrigada a passar parte do ano agrícola no submundo. Mas quando contamos algo sobre alguém, falamos mais de nós do que do outro. Talvez seja isso que os gregos gostariam de passar, segundo sua cultura. Mas e segundo a nossa?

É interessante pensar que a Deusa, ao ser levada ao Submundo, não se submeteu, mas aceitou sua posição como Rainha dos Mortos. E mais: ela o fez para oferecer aos outros cuja morte também rapta, uma esperança: a da vida eterna. No submundo, Kore não só encontra seu nome, mas seu destino de levar aos-que-se-foram-antes, a Luz da Esperança. É o que nos faz pensar a estudiosa e sacerdotisa Rachel Pollack, em seu livro "O Corpo da Deusa". Leitura essencial.

Acreditamos que todo o nome seja mágico, e que o poder está nas mãos e ações de seu usuário. Esta seria a função do nome: um marco, um farol, uma referência de seu portador.

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